quarta-feira, 14 de março de 2007

ADVOGADA GAÚCHA RECEBE INDENIZAÇÃO MILIONÁRIA POIS SEU NOME É ASSOCIADO A EX-GAROTA DE PROGRAMA

Segue a sentença:

Espécie: AÇÃO COMINATÓRIA CUMULADA COM AÇÃO INDENIZATÓRIA
Requerente: D.P.C.S.
Requerida: MONTAURY PIMENTA MACHADO E LIOCE S.C. LTDA
Data da Prolação: 09 DE MARÇO DE 2007
Juiz Prolator: MAURO CAUM GONÇALVES
Vistos etc.
1.0) RELATÓRIO:
D.P.C.S., qualificada na inicial, moveu Ação que nominou Indenizatória por danos morais, com pedido de antecipação de tutela, em face de MONTAURY PIMENTA MACHADO E LIOCE S.C. LTDA, também qualificada, alegando ter realizado a consulta de seu nome no saite http://www.google.com.br/, cujo domínio foi registrado no Brasil em nome da demandada, e constatado que estava vinculada a páginas não condizentes com sua conduta social, ofensivas à sua honra e plagadas de termos e expressões de baixo calão e de conotação extremamente vulgar. Pretende, liminarmente, a exclusão dos conteúdos que associam seu nome a conteúdo de cunho pejorativo e injurioso, assim como indenização pelos danos morais sofridos. Juntou documentos (fls. 10 a 50).
À fl. 53 foi deferida a liminar para exclusão de resultados de pesquisa que relacionavam o nome da autora ao material ofensivo a sua reputação.Citada, a requerida compareceu aos autos e nomeou à autoria (fls. 71/97) a empresa Google Brasil Internet Ltda., alegando não ser responsável pelo saite que motivou o ajuizamento da presente ação, mas apenas prestar o serviço de registro de direitos de propriedade intelectual para a empresa Google Inc no Brasil.
A autora recusou a nomeação à autoria, do que o juízo declarou a ausência de efeito desta, determinando que a requerida apresentasse contestação (fl. 100). A demandada contestou, argüindo, como preliminar, ilegitimidade passiva sob o argumento de ser uma prestadora de serviços da empresa Google Inc. e alegando uma possível inviabilidade futura no cumprimento de eventual condenação em obrigação de fazer. Alegou ser mero escritório comercial no Brasil, sem qualquer controle ou acesso ao banco de dados do saite www.google.com.br.
No mérito, discorreu sobre a limitação de responsabilidade dos provedores de serviço de Internet e ratificou a impossibilidade de ingerência técnica em dados relativos às pesquisas realizadas. Requereu, em não sendo acolhida a preliminar, a improcedência da ação.Sobreveio réplica à contestação (fls. 126/237).
Foi o relatório.
Passo a motivar a decisão.
2.0) FUNDAMENTAÇÃO:
A matéria a ser analisada é de fato e de direito, mas não há necessidade de se produzirem outras provas em audiência, devendo-se proceder ao julgamento antecipado da lide, nos termos do disposto no art. 330, I, do CPC.2.1)
Da Preliminar de Ilegitimidade Passiva:
Analiso a preliminar de ilegitimidade passiva, argüida pela demandada.O fato do domínio http://www.google.com.br/ estar registrado no Brasil em nome da requerida restou incontroverso. Em tendo esta apontado que Google Inc. é a empresa responsável pela disponibilização da página http://www.google.com/ restou evidente que ambas empresas possuem os mesmos interesses financeiros, sendo a demandada a representante daquela no país.Nesse mesmo entendimento, o julgamento de Agravo de Instrumento proferido pela Des. Marilene Bonzanini Bernardi, em caso semelhante.
RESPONSABILIDADE CIVIL. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. OBRIGAÇÃO DE FAZER. ORKUT. COMUNIDADE VIRTUAL. UTILIZAÇÃO DE FOTO ALHEIA SEM AUTORIZAÇÃO, DE FORMA PEJORATIVA. DETERMINAÇÃO PARA REMOÇÃO. GOOGLE BRASIL - ALEGAÇÃO DE IMPOSSIBILIDADE DE SER DESTINATÁRIO DA DETERMINAÇÃO DO JUÍZO REFERENTE AO ORKUT. Verificando-se que a ré participa do mesmo grupo econômico e se apresenta ao consumidor de idêntica forma que a empresa sediada nos EUA que detém o comando do ORKUT, não procede a sua alegação de impossibilidade de ser destinatária de determinações referentes ao ORKUT. Aplicação da teoria da aparência. DETERMINAÇÃO PARA REMOÇÃO DE FOTO UTILIZADA PARA ILUSTRAR PÁGINA DE COMUNIDADE. Não há qualquer óbice ao cumprimento da determinação de exclusão da foto que supostamente seria da autora e que foi utilizada para ilustrar Comunidade do ORKUT, evitando, assim, maiores dissabores e danos à autora, sem que haja, de outro lado, qualquer prejuízo ao demandado. VEDAÇÃO DE OCORRÊNCIAS FUTURAS RELACIONADAS À AUTORA. Parece complicado que a recorrente possa impedir a divulgação futura de imagem da agravada, uma vez que as informações postas no site Orkut são definidas pelos usuários, e não pela empresa. E não se cogita de suspensão de todo o serviço apenas para proteger a imagem da demandante, gerando a medida, neste caso, ônus excessivo em relação ao direito que se visa tutelar. FIXAÇÃO DE ASTREINTES Tratando-se de obrigação de fazer, perfeitamente cabível a incidência das astreintes, em consonância com o art. 461, § 5º, do CPC. AGRAVO DE INSTRUMENTO PARCIALMENTE PROVIDO. (Agravo de Instrumento Nº 70015755952, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marilene Bonzanini Bernardi, Julgado em 09/08/2006)
No que pertine aos argumentos lançados pela demandada, acerca da impossibilidade técnica de ingerência no banco de dados do saite para exclusão das referências ofensivas à autora, entendo ter a requerida legitimidade e, por via de conseqüência, efetivas condições de atender o comando judicial da exclusão (já tendo tomado tal providência), pois é a demandada representante da empresa que cita como responsável, no Brasil.
Ante às considerações já manifestadas, entendendo ser a demandada, representante legal da empresa norte-americana no país e, por isso, solidariamente, responsável, pelos atos daquela.Afasto, assim, a preliminar de ilegitimidade invocada, consubstanciado na Teoria da Aparência.
2.2) Do Mérito:
Em que pese tenha a ação sido nominada apenas como indenizatória, se verifica que a pretensão é de cominar obrigação de fazer (a exclusão dos sites que associam o nome da autora a conteúdos de cunho pejorativo e injurioso da página da demandada), cumulada com indenização (por dano moral).
Analiso, pois, a demanda sob tais aspectos.
2.2.1) Da Cominação de Obrigação de não fazer:
No caso em tela, foram trazidas aos autos provas inequívocas do vínculo entre o nome da autora e sites não condizentes com sua conduta social. Sua imagem e sua honra, direitos fundamentais garantidos pela Constituição Federal de 1988 em seu artigo 5° X, foram gravemente violados, considerando o teor dos documentos e o alcance mundial da humilhação.
Assim, deve a requerida fazer cessar qualquer veiculação em nome da autora relacionada a questões pejorativas ao seu caráter e que a relacionem com material ofensivo à sensibilidade social.
2.2.2) Dos Danos Morais:
Frise-se que a ocorrência dos danos morais, no caso em epígrafe, é presumida, ou seja, deriva do próprio fato ofensivo, de maneira que, provada a ofensa, no caso a divulgação de conteúdo ofensivo à honra da autora, resta demonstrado o dano.Em outras palavras, o dano moral existe in re ipsa.
Destarte, tenho como caracterizados os danos morais causados à demandante, devendo a requerida ser condenada ao pagamento de indenização, cujo montante passo a delimitar.
Em que pese a inexistência de critérios objetivos para a quantificação da verba indenizatória a título de danos morais, deve o julgador, munido da lógica do razoável, examinar certos elementos, entre os quais encontram-se a gravidade e repercussão do dano sofrido, a reprovabilidade da conduta e a capacidade das partes.
Segundo Carlos Alberto Bitar, em artigo publicado no Caderno de Doutrina/Tribuna da Magistratura, em julho de 1996, sobre a definição do valor da indenização por Danos Morais: “... parece-nos de bom alvitre analisar-se, primeiro: a) a repercussão na esfera do lesado, depois, b) o potencial econômico-social do lesante e c) as circunstâncias do caso, para finalmente se definir o valor da indenização...”
No caso em tela, o dano moral foi decorrente da injúria e da difamação sofridas pela autora. Frise-se que esta é mulher casada, mãe de família e profissional nas áreas do Direito e da Psicologia. O fato de seu nome ter estado associado a materiais de cunho vulgar e depreciativo à sua honra, agregado ao alcance mundial da lesão, provocou dano gravíssimo e irreparável à esfera pessoal da autora.
De acordo com os ensinamentos do emérito doutrinador Galeno Lacerda, nos casos de dano moral ocasionado por crime tipificado no Código Penal, como observado no caso em questão, devemos, considerando a unicidade do sistema jurídico, analisar conjuntamente o que dispõe o Código Penal em relação às multas decorrentes de ilícitos.Transcrevo, pela pertinência, a argumentação do ilustre professor, em artigo publicado em junho de 1996 (RT-728, p. 94 a 101): “... o máximo da pena de multa que, em tese, poder-se-á, no sistema atual do Código Penal, atribuir a qualquer delito, inclusive calúnia ou injúria, paradigma da lei civil (art. 1547) é de 5.400 salários mínimos, valor que se obtém seguindo o roteiro legal, senão vejamos:O artigo 49 do Código Penal diz que a multa máxima corresponderá a 360 dias-multa. E o valor máximo do dia-multa, diz o §1°, daquele artigo, é cinco salários mínimos. Então, 360 x 5 = 1.800 salários mínimos.Mas o artigo 60 §1°do mesmo CP salienta que “a multa pode ser aumentada até o triplo, se o juiz considerar que, em virtude da situação econômica do réu, é ineficaz, embora aplicada no máximo”.
Então, a multa máxima do Código Penal para qualquer delito, inclusive a injúria e a calúnia, repita-se, é de 5.400 salários mínimos.E como o artigo 1.547, parágrafo único, do Código Civil, prevê o dobro da pena pecuniária criminal, chega-se a um total máximo, no cível, de 10.800 salários mínimos”.
O entendimento do emérito doutrinador é compartilhado por este juízo, com o objetivo de fixar um valor indenizatório justo, considerando a gravidade dos danos sofridos pela autora e a condição da demandada, empresa multinacional que, como é sabido por todos, aufere lucros gigantescos em todo o planeta.
Assim, além da intensidade do sofrimento causado, é de ser considerado o poderio econômico da requerida na fixação da verba indenizatória, para que não perca o seu caráter de sanção, vez que a pena deve sempre trazer uma desvantagem maior que a vantagem auferida pelo crime/ilícito, para que exerça a prevenção sobre o ato danoso (Teoria da Prevenção).
Considerando a doutrina de Galeno Lacerda, tem-se que, sendo certo que o dano é irreparável, é justo que haja ao menos uma compensação em virtude do erro da demandada. Compensação esta que fixo em valor equivalente a 10.800 salários-mínimos, vigentes na data da publicação da presente, isto é, R$ 3.780,000,00, a serem corrigidos, desta data, monetariamente, pelo IGP-M, e acrescidos de juros de mora de 12% ao ano, desde a data de cometimento do ilícito (publicação do conteúdo ofensivo à honra da autora).3.0) DISPOSITIVO:
Isso posto, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados por D.B.C.S. nos autos da Ação Cominatória cumulada com Ação Indenizatória, que moveu contra MONTAURY PIMENTA MACHADO E LIOCE S.C. LTDA, e comino à requerida a obrigação de fazer a exclusão dos sites que associam o nome da autora a conteúdos de cunho pejorativo e injurioso, de sua página de buscas, tornando definitiva a antecipação de tutela concedida à fl. 53; e condenando a requerida ao pagamento de uma indenização, por dano moral, no valor de R$ 3.780,000,00, corrigidos monetariamente pelo IGP-M desta data; acrescidos de juros de mora de 12% ao ano, desde a data da verificação da presença do nome da autora relacionado a material não condizente com sua conduta social (11/10/2005 – fls 35-40).Condeno, ainda, a requerida a arcar com as custas processuais e com os honorários advocatícios devidos ao patrono do autor, que fixo em 20% sobre o valor da condenação pecuniária, forte no §3º, do art. 20, do CPC.
Publique-se.
Registre-se.
Intimem-se.
Porto Alegre, 09 de março de 2007.
MAURO CAUM GONÇALVES,
Juiz de Direito da 3ª Vara Cível, 1º Juizado.

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